Por que alguns gestores enchem os funcionários de tarefas só para tê-los ocupados?
Os gestores enchem os funcionários de tarefas por relacionarem a produtividade à sobrecarga de trabalho. Nesse modo, o foco é a jornada trabalhada, não as entregas. Porém, isso gera uma pressão e a realização de trabalhos inúteis. Por isso, é preciso mudar de paradigma.
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Você conhece alguma empresa em que os gestores enchem os funcionários de tarefas? É provável que sim. Praticamente, todo mundo já teve essa experiência, porque esse é o chamado modelo tradicional.
Basicamente, o pensamento dos gestores é esse: “se eu pago o salário para o funcionário ficar 8 horas por dia na empresa, ele precisa se ocupar durante todo esse tempo”.
Afinal, tirar um tempo para tomar um cafezinho representa uma quebra de produtividade para quem acredita nessa ideia.
O problema é que essa opinião está muito ultrapassada e já não condiz com a ideia do home office e trabalho remoto. Isso porque a ideia de liderança mudou e o trabalho com foco nas entregas é cada vez mais comum.
Então, por que alguns gestores ainda enchem os funcionários de tarefas só para tê-los ocupados? Vamos apresentar algumas ideias neste artigo. Saiba mais.
A falácia do conceito do trabalho por hora
O modelo de trabalho tradicional é aquele em que o colaborador é pago por hora. Por isso, os gestores passam cada vez mais tarefas para garantir que o funcionário trabalhe por 8 horas — ou passe essa impressão.
Essa expectativa acaba sendo uma falácia. Fazendo um gerenciamento de tempo eficiente, percebi que eu trabalhava por volta de 5 horas por dia, em vez das 8 horas esperadas.
Nessa época, eu já não trabalhava em uma empresa. No entanto, esse dado demonstra o que acontece com muitos funcionários por aí.
Para quem está em uma empresa que ainda não prega o que é liderança de maneira efetiva, o resultado é a sobrecarga de trabalho. Isso porque a redução do fluxo de tarefas faz com que a gerência encontre outras formas de continuar ocupando os funcionários.
Esses são os trabalhos inúteis, ou seja, realizados sem propósito. O conceito é sinalizado pelo instrutor de liderança e desenvolvimento de Indiana (EUA), Randy Clark.
Em entrevista à BBC, ele disse que esse tipo de tarefa “não leva a nenhum objetivo e não melhora a pessoa, a empresa, nem a cultura”. O especialista ainda traz alguns exemplos desse tipo de atividade. Veja:
- Preparação de um relatório sem objetivo;
- Codificação de uma planilha por cores;
- Conferência de uma apresentação já revisada.
A situação é bastante complicada. Um estudo feito em 2016 e mencionado pela BBC comprovou que os trabalhadores passam apenas 39% da jornada de trabalho com tarefas reais. O restante do tempo são reuniões, e-mails e trabalhos inúteis.
Isso demonstra que é necessário estabelecer uma liderança humana, que foque o que é realmente importante. Portanto, é preciso haver uma quebra de paradigma para que as tarefas sem propósito sejam deixadas de lado.
Sobrecarga de trabalho x produtividade
Os gestores enchem os funcionários de tarefas para manter o controle do que está sendo feito. Mais especificamente, porque relacionam a sobrecarga de trabalho à produtividade.
Assim, acontecem injustiças. Isso porque os colaboradores são mais avaliados pelas horas ocupadas do que pelas entregas realizadas.
Essa deve ser uma das lições de liderança mais importantes. Afinal, a empresa pode ter problemas para formar uma equipe de alta performance justamente por deixar de atentar aos resultados.
Nesse cenário, o trabalho remoto apresentou uma perspectiva diferente. Ou seja, os colaboradores podem ter autonomia e, ainda assim, garantirem bons resultados.
Isso é o que mostram várias pesquisas sobre esse regime de trabalho. Uma delas, realizada pela Fundação Dom Cabral, demonstra que 58% dos entrevistados afirmam ser mais produtivos ou significativamente mais produtivos quando estão fora do escritório.
Esse benefício, aliado à redução de custos, faz com que muitas empresas optem pelo trabalho a distância, total ou parcial, nesse pós-pandemia.
Tanto é que um estudo da consultoria KPMG sinalizou que 85% das empresas que migraram para o home office durante a crise sanitária querem efetivar o modelo híbrido.
O problema do microgerenciamento
Uma das dificuldades do modelo de gestão tradicional se refere ao microgerenciamento. Nesse regime, os gestores enchem os funcionários com tarefas, porque querem saber o que eles estão fazendo a todo momento.
Com o modelo remoto exigido a partir da pandemia do coronavírus, uma perda de confiança dos gestores em seus funcionários foi registrada.
Na mesma matéria da BBC já citada, foi relatado que um estudo da Harvard Business Review de julho de 2020 mostrou que 41% dos gerentes tinham dúvidas sobre a motivação de seus colaboradores.
Além disso, quase um terço achava que os funcionários não tinham o conhecimento nem conheciam as técnicas necessárias à sua função.
Esse cenário é relatado pela professora de Administração da Escola de Negócios D’Amore-McKim, de Massachusetts (EUA), Barbara Larson.
Segundo ela, “os gerentes podem nem mesmo saber se o funcionário terminou seu trabalho principal, mas enviam mais tarefas inúteis para ter certeza que eles não terminem”.
Ela ainda reforçou que “são tarefas literalmente delegadas para garantir que os funcionários fiquem trabalhando, de forma que o gerente tenha a sensação de que eles ainda estão sob controle”.
A pressão dos funcionários para parecerem ocupados
A exigência dos gestores que enchem os funcionários de tarefas só para tê-los ocupados faz com que os próprios colaboradores executem trabalhos inúteis por conta própria. Isso acontece, especialmente, quando estão a distância.
Por isso, mandam mensagens e e-mails para mostrarem que estão trabalhando. Também geram relatórios sem sentido e se dispõem a executar tarefas desnecessárias.
A mesma ideia é seguida por quem teme que o gestor os encha de tarefas. Então, já propõem ideias para parecerem ocupados e mostrarem que “vestem a camisa” da empresa.
Outra estratégia é a sugestão de encontros online desnecessários. Mesmo usando as melhores plataformas para reunião, o assunto deve ser relevante. Caso contrário, torna-se uma perda de tempo.
Por isso, Larson destaca que o gestor que enche o colaborador de tarefas “pode ser muito desmotivador para o funcionário remoto. É sinal de falta de confiança e de cuidado. A tragédia real do trabalho inútil é a oportunidade que é perdida. Existem tantas coisas benéficas para o funcionário e para a empresa que poderiam ser feitas naquele tempo”.
Como quebrar o paradigma?
Muitas empresas já adotam um modelo mais flexível e voltado para as entregas. É o caso o Woba, que tem nômades espalhados por vários lugares do Brasil e do mundo.
Com uma cultura voltada para os resultados, o objetivo é garantir a autonomia dos funcionários. Dessa forma, há um verdadeiro engajamento.
A mesma ideia é propagada por Larson. A especialista afirma que o ideal são as entregas baseadas em resultados. Portanto, se um funcionário teve tempo para um intervalo ou saiu mais cedo, é uma recompensa pela alta produtividade que apresentou durante o dia.
Em outras palavras, o próprio colaborador é capaz de gerenciar o seu tempo e reconhece suas responsabilidades. Além disso, busca ser o mais produtivo possível, porque isso é positivo para ele.
Essa mudança de estilo de trabalho é um aprendizado online importante. E vale tanto para gestores quanto para funcionários.
Os primeiros percebem que não precisam microgerenciar e podem dar um voto de confiança. Enquanto isso, os segundos reconhecem que precisam cumprir seus compromissos para não terem problemas.
Ao adotarem essa postura, os líderes passam atividades que realmente agregam valor. Assim, mudam totalmente o modelo tradicional e estabelecem uma relação de confiança. A consequência são melhores resultados.
Portanto, ao pensar por que alguns gestores enchem os funcionários de tarefas só para tê-los ocupados, lembre-se de que isso tem uma relação muito próxima com o modelo de trabalho tradicional. No entanto, é possível vivenciar uma cultura remota e flexível. Tudo sem deixar de lado os objetivos estratégicos.
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Texto escrito por Fabíola Thibes, jornalista e redatora web.